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Querem cancelar a Black Friday?

De forma isolada, algumas marcas estão mudando o nome que se dá a um dos períodos mais importantes para as vendas do varejo em todo o mundo...será que vai ficar assim?

Considerada a data de compras mais importante dos Estados Unidos, há quem diga que a Black Friday já não é mais a mesma.

Durante décadas, o dia após o Dia de Ação de Graças levou multidões e milhares de consumidores às portas das lojas horas antes de sua abertura em busca das melhores ofertas. Com uma pandemia em curso, especialistas se dividem sobre o evento deste ano.

São clientes evitando aglomerações, varejistas receosos em fazer estoque e um contexto totalmente inesperado. O aumento no desemprego, a restrição no consumo e muitos outros efeitos da maior crise sanitária que devem interferir na busca por produtos nesta Black Friday. Mas, não é só isso.

Em meio a tantas notícias desanimadoras e manifestações contra o racismo se espalhando pelo mundo, o mercado pode criar novas possibilidades para a data.

Na tradução para o português, Black Friday significa sexta-feira preta e, por isso, tem levado empresas a repensaram o uso da expressão considerada por elas racista.

Em uma explicação sobre o uso do termo, Guilherme Gobato, fundador da consultoria em diversidade e inclusão Diálogos Entre Nós, diz que no Brasil, o racismo se reverbera no vocabulário. Usa-se as palavras preto e negro para desqualificar alguma coisa. "Então quando falamos de Black Friday no Brasil, chamamos de ‘preto’ o dia em que produtos são vendidos a um preço menor, inferior”.

Por outro lado, embora também concorde que a expressão sugira um comportamento racista, Ricardo Silvestre, criador da agência Black Influence, que conecta influenciadores e criadores de conteúdos negros, levanta outro tipo de reflexão.

A associação negativa poderia ser substituída por algo positivo, já que se trata de um dia em que as pessoas conseguem comprar produtos por um preço mais justo em um momento muito esperado.

No Brasil, o Grupo Boticário saiu na frente e não usará mais a expressão "Black Friday". O evento, que este ano acontece em 27 de novembro, passará a ser chamado de "Beauty Week", de acordo com o anúncio feito por Artur Grynbaum, CEO da empresa, em uma publicação no LinkedIn.

Nas palavras do executivo, há anos a companhia discute sobre a origem do termo e não confirmou "dados científicos que comprovem que o termo realmente não se relaciona à questão da escravatura".

Mesmo assumindo que a mudança pode trazer riscos para o negócio, Grynbaum diz ser necessário provocar discussões construtivas na sociedade.

"Precisamos de algo maior e essa transformação deve começar por nós. Esse movimento emergiu nas equipes do Grupo Boticário, a discussão ganhou força e esse é o resultado mesmo com pouco tempo para adaptarmos a estratégia", diz.

O executivo ainda fez um convite a outras lideranças empresariais a realizarem o mesmo como forma de mais uma contribuição para uma nova perspectiva de raça na sociedade, com senso de urgência e coragem.

Sob outra justificativa, porém com o mesmo efeito, a Imaginarium também substituirá o termo por "Color Friday".

De acordo com a marca, a nova expressão traz uma conotação mais otimista e irá exaltar as cores, trazendo leveza em um ano que foi repleto de temores e incertezas.

Segundo o diretor da marca, Donato Ramos, repensar as estratégias de negócio constantemente é essencial para falar com o consumidor e alimentar a conexão que a Imaginarium mantém com as suas tribos.

“Nossas ações buscam estar alinhadas com o contexto social que todos vivem. Sem dúvidas, 2020 tem sido um ano desafiador para todos, e nada melhor do que proporcionar alegria por meio de detalhes numa ação como essa", diz.

COMO SURGIU

Sem ter a sua origem bem definida, uma das histórias americanas diz que a expressão era um apelido usado pela polícia da Filadélfia no início da década de 1990 para o dia seguinte ao feriado de Ação de Graças, que abria temporada de compras de Natal.

O termo também foi associado ao fato de várias empresas relatarem que vários funcionários faltavam na sexta-feira após o feriado de Ação Graças, alegando que estavam doentes somente para emendar o feriado com o fim de semana.

Já na área financeira, a palavra "black" assume outra conotação nos Estados Unidos, que é o equivalente ao "estar no azul" brasileiro. Ou seja, estar bem financeiramente.

Outra história mais antiga associa a Black Friday também a uma crise financeira de 1869, quando, supostamente, dois especuladores tentaram tomar o mercado de ouro e acabaram quebrando a bolsa de valores de Nova York naquela data.

OUTROS CAMINHOS DA BLACK FRIDAY

Para Tâmara Wink, diretora de estratégias da Economídia, esses posicionamentos fazem sentido e devem continuar nos próximos anos e ser aderido por outras empresas, pois o comportamento do consumidor está em evolução e isso muda a forma como ele se relaciona com as marcas - cada vez mais informados, conectados e conscientes.

"Nada o prende a uma marca a não ser a identificação, e as marcas não podem se manter passivas. É preciso ter um posicionamento que demonstra no que uma marca acredita, aplica e valoriza", diz.

Embora atitudes estejam sendo tomadas, o assunto já vem sendo discutido há alguns anos pelo mercado por vários motivos.

Um artigo publicado pelo Washington Post, em 2015, falava sobre a extensão da data com antecipação de ofertas, a consolidação da Cyber Monday, a tentativa da Black November, entre outras.

Algumas tentativas isoladas não deram certo. O eBay lançou a Cyber 12 para descrever as ofertas do período que define a Ação de Graças e os onze dias que o sucedem.

O mesmo artigo fala sobre o Five-Day Frenzy, na tradução Frenesi de Cinco Dias, como nome que captura melhor esse clima de maratona de compras em vez de apenas um dia. Na Gamestop, internamente, não se fala em Black Friday e membros da equipe se referem a este período como os Playoffs de Varejo, remetendo às finais da NBA.

Na época, especialistas falavam também sobre frisar a importância do canal digital da data, e sugeriam o termo "Holiday Shipstorm", num momento em que a maioria dos varejistas ainda não estavam preparados para oferecer diferentes opções de frete, como entrega no mesmo dia ou após o expediente.

Sem associar a novidade à Black Friday, a Amazon também está tentando encontrar o seu próprio caminho para a data com um novo chamariz.

O chamado “Amazon Prime Day”, data promocional mais importante da rede varejista no ano, é uma antecipação da Black Friday e acontece anualmente desde 2015, um mês antes da Black Friday. Nessa onda, a concorrência seguiu o mesmo caminho - a Target com seu “Deal Days”, o Walmart com seu "Big Save Event" e a Best Buy já com Black Friday 2020 Deals.

São essas razões que levam muitos especialistas americanos a pensarem que o evento que costumava reunir multidões está fadado ao fracasso daqui em diante.

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