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Por que explicitar o custo das coisas atrai cada vez mais clientes

Quando o negócio nasce como uma ideia de venda direta ao consumidor, como numa loja on-line, essa transparência de preços pode fazer ainda mais diferença

Para fazer sua sacola Kennedy Weekender, a empresa de acessórios e artigos de couro Oliver Cabell gasta US$ 16,02 com a lona, US$ 11,58 no couro, US$ 5,68 com o forro e US$ 0,78 no tecido do acabamento. O zíper custa US$ 4,27. No total – incluindo a produção, o transporte, os impostos e outros gastos – o custo é de US$ 110,35 para criar a bolsa, vendida on-line por US$ 285.

Muita informação? Não. Essa prática, chamada de transparência de preços, está crescendo entre um grupo seleto de lojistas, que diz que ela agrada em particular aos millenials – que normalmente querem saber não apenas a proveniência dos produtos que compram, mas também pelo que exatamente estão pagando.

Enquanto a maioria das lojas esconde detalhes para que os consumidores não saibam o quanto estão pagando a mais, a Oliver Cabell exibe as descrições de todos seus produtos no site, para que seus clientes possam ver exatamente pelo que estão pagando e quanto a empresa cobra além dos custos de produção.

“A transparência de preços é muito importante para os consumidores que querem se certificar de que todo mundo recebeu um pagamento justo no processo”, disse Bruno Pieters, fundador da Honest By, loja de roupas e acessórios na Bélgica.

Usando o slogan “A primeira empresa mundial com 100 % de transparência”, ela divulga uma discriminação de preços tão completa que inclui até as etiquetas de tamanho e de preço.

Por exemplo, uma camiseta preta de algodão orgânico, vendida como vegana, orgânica e suave para a pele, custa cerca de US$110 (Na União Europeia, o preço inclui um imposto sobre a mercadoria) ou US$90 (em outros locais, sem o imposto).

Entre os inúmeros detalhes que o consumidor pode descobrir sobre o produto estão a etiqueta (US$0,67), feita de celulose 100% livre de madeira e tratada com carbonato de cálcio; a camiseta em si foi costurada e acabada na Alemanha, custando à loja cerca de US$13,50. (Todos os preços foram convertidos do euro.)

Pieters explicou por e-mail que sua decisão de exibir seus produtos dessa maneira veio da época em que trabalhou para uma grande casa da moda.

“Via como as empresas para as quais trabalhava e outras levavam sua produção da Bélgica ou da França para o Vietnã ou a Índia, mas mesmo assim cobravam os mesmos preços de antes”, disse ele. Outras preocupações éticas, como salários justos, também entraram na sua decisão.

Scott Gabrielson, que teve a ideia de abrir sua empresa de acessórios e artigos de couro, a Oliver Cabell, quando fazia seu MBA em Oxford, disse que a possibilidade de vender diretamente ao consumidor on-line teve grande influência em sua decisão de usar a transparência de preços.

Ele queria mostrar que, ao eliminar a loja física e outros custos embutidos no produto, os consumidores iriam poupar dinheiro ao comprar roupas.

“Ao eliminar a tradicional venda por atacado, é possível vender diretamente ao consumidor e oferecer um produto de muito mais qualidade por um preço menor – o que faz isso funcionar é economia pura”, disse Gabrielson.

Como provar que as coisas valem o que valem

Porém, um de seus maiores desafios foi convencer os compradores de que os produtos que vende valem o custo, especialmente quando tudo o que se tem são as fotos no site.

Só que esse ceticismo pode estar acabando, conforme os consumidores vão migrando de lojas físicas para as on-line. Natalie Grillon, fundadora do Project Just, que coleta dados sobre ética e sustentabilidade de marcas da moda, disse acreditar que a transparência de preço daria uma vantagem aos lojistas que a usarem.

“Perdemos a compreensão do valor das roupas que compramos. A transparência de preços e as histórias dos bastidores ajudam o consumidor a aceitar a decisão de pagar mais caro por um produto”, disse ela.

Para algumas empresas de vestuário, a transparência de preços é usada ocasionalmente ou apenas em um ou outro artigo. Por exemplo, a marca de moda masculina Noah, com sede em Nova York, que diz tentar unir “a vitalidade rebelde da cultura do skate, do surf e da música com uma apreciação inovadora da moda masculina clássica”.

Brendon Babenzian, o proprietário, disse que os consumidores ficaram “muito acostumados a pagar pouco pelas coisas”. Para ajudá-los a entender o setor, ele detalhou a produção e o preço de um de seus produtos típicos: uma jaqueta de duas tonalidades.

Ela é vendida por US$ 448. Os zíperes, o velcro, os botões e os cordões são todos italianos e, ao todo, custam US$ 16,88. O forro vem do Japão e custa US$ 2,18 por jaqueta. A etiqueta customizada é US$ 0,75, e a costura e o acabamento, US$ 122,29 – entre outros custos.

Babenzian tenta mostrar ao consumidor os verdadeiros gastos necessários na produção de roupa de qualidade. Para o futuro, ele disse estar planejando usar essa lista de valores estrategicamente, em casos nos quais um produto pareça ser mais caro do que o consumidor espera.

Na abertura de uma loja em Londres, Babenzian escreveu em seu site: “Um rapaz veio diretamente até mim e perguntou por que uma de nossas jaquetas era tão cara. Ele segurava uma versão à prova d’água, com as costuras seladas, que eu ajudei a produzir vários anos atrás. Ele a adorava.”

Segundo Babenzian, o rapaz lhe perguntou: “Essa jaqueta tem costuras impermeáveis e custa menos que a da Noah, que não tem essa característica. Por que isso?”.

Nessa altura, o dono da loja disse: “Eu estava louco para falar sobre isso”.

E respondeu: “As coisas que fazemos geralmente duram mais que outros itens que são feitos para se desgastar rapidamente; além disso, o tecido geralmente determina a longevidade de uma roupa. E tem mais: essa história do ‘bom e barato’ é uma mentira”.

Outros lojistas já tiveram esse mesmo tipo de frustração. Elizabeth Pape, dona da empresa e revenda de roupas Elizabeth Suzann, diz que a disponibilidade de roupas baratas fez o consumidor desprezar itens mais caros, mesmo que mais duráveis.

Elizabeth Pape, dona do estúdio de moda Elizabeth Suzann, em Nashville, Tennesse, é uma grande defensora da prática de transparência de preços.KYLE DEAN REINFORD NYT

Em um post no blog “Money Talk”, em seu site, Pape detalhou não apenas o que é preciso para produzir suas roupas, mas também sobre as finanças administrativas de seu negócio. Quando empresas populares como H&M, Zara e Forever 21 começaram a vender mais barato que lojas como Gap, J. Crew e Macy’s, estas diminuíram seus preços.

“Isso criou o ambiente perfeito para a propagação da ideia de que roupas são artigos descartáveis”, escreveu Pape.

Em comparação, seu sobretudo Artist, que custa US$185, que ela menciona no post é “produzido integralmente, do corte até a costura, com exclusividade, em nosso estúdio em Nashville”. Só a matéria prima usada custa US$31,74. A mão de obra – incluindo corte, costura e lavagem – fica em US$20,89. O desperdício, que ela descreve como pausas no trabalho e retalhos que sobram do material, que não podem ser utilizados posteriormente, custam algo em torno de US$63,16.

Alguns consumidores se preocupam mais com as condições em que as peças são produzidas e menos com a discriminação dos preços. Page Perrault, de 28 anos, analista bancária de Athens, Geórgia, que é cliente da Elizabeth Suzann e da Everlane, uma loja on-line que anuncia “transparência radical”, gosta de ver as razões por trás dos preços. Mas não considera a prática um fator fundamental para suas compras. “E legal que exista, mas não é necessária”, disse.

Vincent Quan, professor de Administração do Instituto Tecnológico da Moda, vê a prática como valiosa para alguns consumidores, especialmente os ambientalmente conscientes, mas menos útil para quem não pode pagar por roupas melhores. “Será que a transparência de preços é transferível para as marcas maiores?”, pergunta ele retoricamente.

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