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Por que as demonstrações contábeis não vêm sendo usadas para as tomadas de decisões?
Tudo começou em 2007 com a Lei nº 11.638, que deu competência à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para editar normas contábeis em consonância com as Normas Internacionais para as companhias abertas
Tudo começou em 2007 com a Lei nº 11.638, que deu competência à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para editar normas contábeis em consonância com as Normas Internacionais para as companhias abertas. Achando que estas normas favoreciam o contador, o Conselho Federal de Contabilidade estendeu estes mesmos procedimentos a todas as pessoas jurídicas.
Depois, em 2009, com a Lei nº 11.941, se modificou a forma de apresentação das demonstrações contábeis (circulante e não circulante), inserindo, para ajustar os ativos e passivos, o valor justo, o valor presente, a essência sobre a forma, além de outras formas de avaliar o patrimônio. Também se excluiu das demonstrações o grupo de "Resultados de Exercícios Futuros". Assim, o patrimônio, antes informado pela essência dos atos praticados pelos gestores, passou a ser informado através das expectativas de realização, o que transformou as demonstrações contábeis em peças aleatórias e subjetivas, para satisfazer os interesses dos investidores e dos especuladores.
O contador, como profissional responsável por estudar o patrimônio das pessoas jurídicas para sugerir procedimentos que melhorem a performance dos agentes econômicos e sociais, vem tendo, hoje, dificuldades para fazer as devidas análises financeiras e econômicas, para saber qual foi o resultado efetivo auferido nas atividades desenvolvidas, em decorrência de todos esses ajustes permitidos. As notas explicativas não são precisas, nem transparentes nos seus conteúdos, e, além disto, são muito extensas.
Algumas obrigações informadas nas demonstrações contábeis não espelham a realidade. Muitas delas sequer são registradas. Ativos e passivos são informados ao valor presente, ao valor justo, modificando o que efetivamente ocorreu. Assim, as demonstrações contábeis estão se transformando em peças fictícias, não verdadeiras, com valores projetados, e não com os valores reais das operações ocorridas.
Usar das normas chamadas de "Contabilidade Internacional" como referência para facilitar o subjetivismo na elaboração das demonstrações contábeis é promover o fim da valorização da profissão contábil no Brasil. Vide o caso das Lojas Americanas, em que as demonstrações contábeis foram fraudadas em mais de 20 bilhões de reais, conforme conclusão dos investigadores. Assim como neste caso, há muitas empresas brasileiras com problemas (cooperativas, planos de saúde, fundos de aposentadorias, empresas públicas etc.). Com tudo isso, hoje, as informações contábeis vêm sendo desconsideradas. Os gestores dos agentes econômicos e sociais, e até a própria sociedade e o s órgãos públicos (que estabelecem valores e preços) dão mais importância às planilhas de custos (elaboradas através de levantamento de valores externos) que às próprias informações contábeis.
Precisamos mudar, e esta mudança deve iniciar pela forma de gerir o Conselho Federal de Contabilidade (CFC). Esta entidade, enquanto órgão público federal, tem o dever de proteger o campo de trabalho dos contadores brasileiros. Devemos rever todas as normas brasileiras de contabilidade implantadas através das ditas "normas internacionais", implementando mudanças na forma de apresentar as demonstrações contábeis.
Seria interessante que as demonstrações contábeis fossem elaboradas com duas ou três colunas distintas, onde, na primeira coluna, seriam informados os saldos apurados, de acordo com os atos efetivamente ocorridos durante a gestão, sem nenhum ajuste; na segunda, os ajustes realizados em cada uma das contas, de acordo com as normas estabelecidas através do valor justo, do valor presente, da essência sobre a forma e de outras formas de ajustes de ativos e passivos; e, na terceira, os novos saldos de cada conta. É importante, ainda, que o grupo de "Resultados de Exercícios Futuros" seja reinstituído, para que se possa informar os compromissos assumidos, não em dinheiro, mas pela entrega de bens e serviços.
Com estes procedimentos, seria possível saber o efetivo resultado econômico e financeiro apurado pelo agente econômico e o contador teria, então, mais segurança na análise destas informações, para orientar os seus clientes na tomada de providências, iniciando-se, assim, a retomada da valorização profissional.
SALÉZIO DAGOSTIM é contador, pesquisador contábil, autor de livros de Contabilidade, professor da Escola Brasileira de Contabilidade (EBRACON), fundador do Sindiconta-RS, presidente de honra da Confederação dos Profissionais Contábeis do Brasil - APROCON BRASIL e sócio do escritório contábil estabelecido em Porto Alegre (RS), Dagostim Contadores Associados, à rua Dr. Barros Cassal, 33, 11º andar - salezio@dagostim.com.br.